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domingo, 7 de agosto de 2016

CANADA E ALASKA DE MOTO - 33


BANFF – KAMLOOPS (bc)
7 agosto 2016-08-07

Hoje acordei bem cedo com uma dor de cabeça enfezada. Acho que foi o tal de  “Chef’s surprise” que comi ontem no jantar. Não sei muito bem do que se tratava mas o marketing no menu era muito bom. Algo mais ou menos como  “se você passou o dia trabalhando no campo, apenas a pão e água, foi para você que nosso Chef criou este prato...”. Eu realmente estava a pão e água e pilotar uma moto na chuva dá um trabalho danado. Pedi o prato, demorou pra caramba e veio fumegando numa travessa pois não cabia em prato de gente civilizada. Tinha muitas coisas, muitas mesmo. Algumas identificáveis, tais como legumes em geral cortados em pequenos pedaços e cozidos, milho, brócolis, couve-flor, carne moída em profusão, bacon (para assegurar o infarto) e alguns outros ingredientes desconhecidos. Tudo isso coberto por um queijo tipo “fromage” (como diz o Peixoto) e vindo diretamente do forno.
Quando acabei de comer estava transpirando como um remador das galés romanas e achei de bom alvitre dar uma amortecida na maldade do prato, para isso uma emborcada do velho Jack é fundamental.
Juntando tudo isso foi uma noite de cão, dor de cabeça e uma nerd que apareceu de madrugada acendendo a luz e quase pisando meu pé para subir na beliche (a cama da infeliz era a que eu estava mas isso ela não vai saber nunca).
Hoje pela manhã, ainda com dor de cabeça e o quarto no escuro, tateei no chão próximo à minha bagagem, achei os óculos e o chinelo e lá fui para o banheiro tomar um banho para ver se melhorava. Quando cheguei no corredor me preocupei mesmo, minha vista, apesar dos óculos, estava embaçada e a visão totalmente desfocada. AVC, diagnostiquei. Só me faltava essa, pensei e implorei ajuda a São Cypriano. Consegui chegar no banheiro e fui até a pia para jogar água gelada na cara mas, ao olhar no espelho não me reconheci. Estava com cara de cretino e com um óculos que não era o meu. Peguei os óculos da nerd maluca !  Fiquei curado do AVC imediatamente. Como sempre São Cypriano não me faltou.
Enquanto isso o Ice estava na cozinha preparando um desjejum para ele e para mim, como seu convidado. Chá,l maçã, yogourte, cereais e uma grande camaradagem. Trocamos e-mails e nos despedimos mas antes ele fez questão de uma foto na Helô para mostrar aos amigos (ele jamais pilotou uma moto).
A verdade é que depois do banho e do desjejum a dor de cabeça sumiu e apenas a sonolência, devido à noite mal dormida, enchia o saco. Mas não tinha alternativa, o hotel em Kamloops já estava reservado.
Sai ainda cedo, por volta das 8 h com a temperatura bem baixa e uma cerração que lembrou os tempos da União e Indústria de madrugada quando eu, meu irmão e mais 3 primos desafiávamos o frio, a falta de dinheiro e o freio mecânico de um Ford 1938 apenas com a doce irresponsabilidade da juventude e o mais fraterno amor que unia (e continuara unindo)  aqueles 5 malucos.....Ah, lamento muito por quem não tem dessas maravilhosas lembranças. Quando nada para verter algumas lágrimas de alegria emocionada ao lembrar de cada um deles, estejam no plano em que estiverem.
Voltemos ao nosso tema.  Mesmo com a cerração eu tinha certeza de que o sol iria se mostrar e o xará não me faltou. Cheguei a parar na beira da estrada aguardando ele vencer uma cerração que teimava cobrir uma bela formação rochosa que eu adivinhava sob aqueles flocos de algodão. Não precisei esperar muito e o sol se impôs, desvendando para quem tem olhos para ver um belíssimo espetáculo que a natureza proporciona diariamente a todos quantos passam por aquele local. Uma pena que os homens são tão apressados, apenas eu e um outro coroa com a esposa assistimos ao despertar das Rochosas....
Muito bom, aliás maravilhoso, curtir estes espetáculos mas a viagem ia ficando mais comprida do que o planejado, a saída é apertar o passo mas por falar em passo eis que surge bem à minha frente o Rogers Pass e a cadeia de montanhas que o guarnecem. Uma visão cinematográfica. Impossível não parar, A viagem que se dane ! Estacionei a moto em uma sombra de uma “Rest Area” que foi implementada bem na entrada do Pass (ou Col para os franceses). Bem no centro da área, foi construído um jardim homenageando a todos que trabalharam no Pass para mante-lo desimpedido e permitir a circulação de pessoas e mercadorias, desde seu descobrimento  ( em 1881 pelo Major Rogers ). Bem como das pessoas que faleceram na grande avalanche de 1910, cujos nomes estão gravados numa das placas que abraçam um sino de bronze sobre uma peça de granito bem no centro do jardim.

Aproveitei para almoçar à sombra de um pinheiro e apreciar as crianças fazendo a maior zona com o sino. Enquanto traçava meu sanduiche de salame italiano e queijo tipo “fromage”, parou um carro bem à minha frente com uma senhora de cara amarrada dirigindo e um coroa muito alto mas bem caidinho. Foi o maior sacrifício ele sair do carro e a mulher continuou sentada sem ajuda-lo. Quando ele conseguiu sair viu logo a Helô e ficou admirando-a, como só eu estava perto ele deduziu que eu era o dono e veio conversar comigo. Perguntou-me quantos centímetros cúbicos o motor. Respondi  “One thausand and four handred”. Eu sei que faltaram mais 50 centimetros cúbicos mas deu tanto trabalho falar as 1.400 que ele não vai nem notar. Depois de perguntar o ano ele falou que também já teve motos mas eu não deveria conhecer pois eram muito antigas e foi na Inglaterra (ele era inglês). Ai foi minha vez de deitar falação pois as primeiras motos pelas quais me interessei foram as inglesas. Perguntei se foi Norton, BSA, Triumph, Matchless, etc... Pronto, o velho acordou para a vida, os olhinhos azuis embaciados ganharam vida, até a voz mudou. “A última foi uma Triumph  Bonneville Silver Jubilee 1977”. Perguntei se ele ainda tinha e a resposta foi “-Vendi.” E com uma careta apontou com o queixo para a mulher dentro do carro. Mas que cretina, pensei, fazer o bom homem vender uma Triumph Bonneville Silver Jubilee. Ele ainda falou-me que quase comprou uma moto chamada Vincent mas ficou com medo pois ela era muito difícil de pilotar. Era a minha deixa, emendei de bate-pronto: “-I think was the Vincent H R D, the legendary Black Shadow” (a moto que cheirava a defunto, segundo a lenda da época – início dos anos 60). O coroa ficou empolgadíssimo e já ia engrenar no assunto mas a velha chata ficou buzinando para irem embora. Ele me pediu desculpas,  apertou minha mão  deu um tapinha na minha cabeça e desejou-me boa viagem. Quando o carro saiu ele bateu a mão e lá se foi, sorrindo e sonhando com a Silver Jubilee que o levava ao horizonte, onde tudo acontece....

Por essas e outras que minhas viagens são demoradas. Um trecho de 500 Km e levei mais de 10 horas. Para complicar ainda aconteceu um acidente com um carro que rebocava uma lancha boçalmente grande (coisa para mais de 32 pés). Os motoristas aqui, quando precisam entrar à esquerda e estão em uma estrada de pista única e mão dupla, ao invés de irem para o acostamento e aguardar uma chance de cruzar a estrada, param na faixa de rolamento e quem vier atrás que se vire. Para mim foi isso que ocorreu, o cara parou e alguém entrou por dentro do transatlântico dele. Quando passei só tinha o reboque todo desconjuntado.















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